terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

É Necessário proibir!

 
Antes que alguém me acuse de reacionário, esclareço que o título acima não tem nada a ver com o lema do maio francês de 1968!
Pensando bem, considerando que os eventos daquela época envolviam aspectos culturais e sociais, até que é possível fazer alguma associação. Mas o contexto é outro, embora muito mais antigo do que qualquer regime de governo autoritário, ou código de conduta socialmente aceito ou imposto. Ele acompanha o ser humano desde a aurora da humanidade; desde que os primeiros hominídeos desceram das árvores e aprenderam a usar o fogo e a fazer ferramentas rudimentares.
Caverna não tinha em qualquer lugar e a vida de nômade começou a perder a graça, quando descobriram a agricultura. Além disso, o ideal era morar perto do mar, rios e lagos, pois ali estavam as terras naturalmente irrigadas e peixes, além da própria água. As primeiras comunidades se formaram nessas áreas, algumas tão próximas que, para se protegerem de predadores e enchentes, construíram as primeiras palafitas.
Nessa mesma época, morar nas montanhas já não era fácil, embora também fosse uma opção de proteção contra riscos de um mundo onde o ser humano ainda não tinha racionalidade suficiente para contornar diferenças grupais ou entender os mecanismos da natureza. Faltava vivência e experiência àqueles pioneiros.
Mas de uma coisa eles não tinham dúvida: era preciso estar perto da água e de alimento, caminhando ao seu encontro, conforme o correr das estações, ou formando comunidades produtivas.
Obviamente, sempre há os que produzem e os que querem tirar dos que produzem. As leis surgiram para estabelecer regras de convívio, apesar da maioria delas, até hoje, acabarem servindo aos interesses da elite governante, de meios de domínio de uns pelos outros, não necessariamente pelo bem de todos.
Daí, proibir virou símbolo do autoritarismo político, ideológico, religioso, psicológico e de tudo mais que se execra e motiva à revolução, que quando usa das mesmas ferramentas, gera contra-revoluções!
Mas, toda proibição é assim?
Não necessariamente! Existem proibições que servem para proteger. Essa é uma forma de educar crianças na primeira infância. Depois disso, proibição sem explicação, ou apenas pelo exercício de mando, realmente não fazem o menor sentido.
Há motivos para proibir a ocupação de encostas de morros e fundos de vales? Há motivos para impedir construções em faixas de domínio de rodovias, ferrovias, dutovias, aeroportos, redes eletrificadas ou margens de rios?
Pode parecer óbvio, sobretudo da parte de quem cria e deve fazer cumprir essas normas; mas, quantas pessoas já morreram em função dessa ocupação indevida que, em vez de coibida pelas autoridades, em alguns casos é até favorecida e consolidada por omissão ou interesse de alguns, em troca de votos e áreas de influência lucrativa?
É certo que ninguém ocupa uma área de risco por opção. Normalmente isso ocorre por falta de opção, sobretudo nos grandes centros urbanos. E quanto mais próspera a cidade mais a especulação imobiliária torna o custo de um terreno inviável para as classes menos favorecidas. E elas precisam estar perto de onde há trabalho!
Nessas grandes cidades, quem constrói em várzeas não o faz para pescar em rios poluídos ou ter uma horta. E para que isso, se o alimento está logo ali, nos empórios e supermercados? Quem habita encostas de morros ou invade faixas de domínio também não pensa em proteção. Pensam, sim, em ter um lugar barato, iludidos ou conscientes, para construir sua casa e estar, na medida do possível, próximos de locais de trabalho, escolas, centros de saúde, enfim, de tudo o que lhes falta em suas cidades de origem. Além disso, instigadas pela sociedade de consumo, algumas desprezam o projeto de uma moradia adequada em nome de outros tipos de conforto, como: motos, carros, eletrônicos e modismos.
Mas isso também é simplificar demais o raciocínio. Mas, a falta dele deságua ou despenca no desastre inúmeras vezes anunciado por vários especialistas, que se esgoelam tentando prevenir; avisando que remediar é até 14 vezes mais caro do que evitar; dizendo que até obras de engenharia sofisticadas e custosas não são capazes de conter indefinidamente a força da natureza, que as faixas de domínio não são apenas áreas para expansão, mas também de segurança operacional. Gritam aos quatro ventos, mas só são escutados quando a terra e a água descem, ou quando o avião cai e o trem descarrila!
Ainda assim, suas vozes decididas, sábias e inconformadas, quase sempre só servem para embasar críticas que logo serão esquecidas: varridas junto com o lodo das enchentes ou enterradas com os mortos das tragédias. Assim é que, passada a estação das chuvas, novas invasões e ocupações de áreas de risco provavelmente ocorrerão, lançando as bases frágeis para novos, previsíveis e sólidos desastres.
“Prevenir é melhor do que remediar!”, diz o ditado, mas, infelizmente, lógica estúpida, a verba sai mais rápido quando o assunto é remediar, embora nem sempre vá para o destino certo, já que, por maiores que sejam os “rios de dinheiro” que afluam, o “ralo” da corrupção ainda continua suficientemente grande para escoá-los.
Mas, alguns governantes de bom senso e desapego político contrariam essa regra nefasta e decidem proibir essas condições inseguras! Seus adversários tentam tirar proveito político disso, mas não em nome da solução de um problema social, e sim pela oportunidade de praticar politicagem e populismo da pior espécie.
Uma das soluções racionais é construir habitações dignas em outras áreas, garantindo financiamento para sua aquisição definitiva. No entanto, as áreas mais baratas normalmente ficam distantes dos locais de trabalho e dos melhores serviços prestados pelo Estado. Isso torna a vida dessas pessoas um moto-contínuo movido a balanço de várias conduções, alimentação inadequada, trabalho mal-remunerado (compensado com “bicos”, nos finais de semana), falta de tempo para especialização e lazer, além de noites muito mal dormidas. Além disso, distância, falta de opções de lazer e da presença do Estado, como garantidor de serviços e segurança, potencializa riscos sociais que também podem transformar sonhos em pesadelos.
Melhorar a infraestrutura e a acessibilidade desses núcleos habitacionais aos centros urbanos, somada à necessária proibição da ocupação de áreas de risco não resolveria todo esse complexo problema, que depende de outras variáveis. Mas, ajudaria muito, com certeza!
Não é comum vermos filmes nos quais pessoas trabalham em grandes centros urbanos, mas vivem em cidades tranquilas, distantes deles, mas a eles ligadas por trens confortáveis e pontuais?
Daí, é necessário proibir e fundamental resolver, o que exige outro tipo de revolução: ética e cultural, além da valorização da opinião técnica!
Ou será que continuarão a preferir contar prejuízos e mortes, em vez de buscar soluções efetivas? Ou a pensar que isso é sazonal e, depois das “Águas de Março”, ninguém mais tocará no assunto ou o levará a sério?
É provável, afinal, o Carnaval está chegando e alguns dos responsáveis por proibir e resolver logo estarão cantando: “As águas vão rolar!” ou “Tomara que chova três dias sem parar!”, sem nenhuma culpa ou pesar.